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FORTALEZA DE SANTA TERESA
Breve notícia histórica (composição e edição de Gabriela Vieira Lopes Ferreira).
Dentro do Parque Nacional, a Fortaleza de Santa Teresa, criada para sua proteção e hoje comandada pelo exército uruguaio, é um dos atrativos mais visitados. Edificada pelos portugueses em 1762 e dominada pelos espanhóis em 1763, apenas 6 meses depois, estes se incumbiram de terminar a construção comandados pelo governador D. Pedro Cevallos.
O forte conta um pouco da cultura e da história do Uruguai e testemunhou numerosas batalhas, não somente entre portugueses e espanhóis, mas também entre espanhóis e criollos e em tempos mais recentes, por volta de 1822, Brasil e Uruguai lutaram para garantir a fronteira, já que esse território era valioso nas estratégias de ocupação da região. Por três anos e três meses, a fortaleza funcionou como domínio brasileiro, mas foi retomada pelas forças de emancipação uruguaia tão logo quando o Brasil deixou de ser colônia portuguesa.
Com os projetos do engenheiro Francisco Rodriguez Cardozo e, em seguida, do engenheiro Juan Bartolomé Howel, criador da fortaleza atual (concluída em 1776), suas muralhas duplas foram erguidas em silharia de pedra granítica lavrada, que atingem até 11,5 metros de altura em alguns pontos e chegam a um perímetro de 642 metros. Os muros também chamam atenção pela cor alaranjada dos musgos. A Fortaleza possui uma grande envergadura na forma de um pentágono irregular (a utilização de uma geometria imperfeita provavelmente foi causada pelas condições topográficas) e cinco baluartes (ou tenalhas) nos vértices. Para os planos de manobra dos canhões e proteção do pátio interno, foram criadas plataformas sólidas ao longo das muralhas. Estes planos eram ligados por rampas para facilitar o deslocamento das peças de artilharia. Assim, Santa Teresa se tornou a fortificação mais expressiva do Uruguai.
Ela esteve abandonada por muito tempo após a perda da sua importância militar, mas a partir de 1927, para apagar o poderio luso, foi reedificada pelo arqueólogo e paisagista Horacio Arredondo e pelos arquitetos Baldomir e Capurro.
Percorrendo seu interior, a Fortaleza de Santa Teresa mostra hábitos, como vestimentas, alimentação e costumes. A majestosa edificação é composta pela casa da Comandância, depósitos de pólvora, capela, canhões nas ameias da muralha, guaritas, ferraria, antiga enfermaria, quartel dos oficiais e das tropas (“cuadras”), biblioteca, túneis que serviam de saídas de emergência em tempos de guerra e pela cozinha (com réplicas de instrumentos utilizados nos séculos XVIII e XIX). Há também um museu sobre a história da própria fortaleza e sobre o funcionamento de sua força militar no século XVIII, com maquetes dos diferentes fortes do Uruguai.
Distando cerca de 40 km de Chuy, no Nordeste uruguaio, a imensa e superlativa Fortaleza de Santa Teresa, uma verdadeira jóia esculpida na América do Sul. Passou do domínio português para o espanhol e vice versa, segundo a tabela abaixo; com o término da Província Cisplatina e a independência do Uruguay, a Fortaleza de Santa Teresa firmou-se definitivamente, no amável país vizinho. Nela, tudo impressiona pelo tamanho, tudo é grande, imenso! A Estereotomia, também!
Ocupações |
1762 – 1763: (6 meses) Portugal |
1763 – 1811: (48 anos) Espanha. |
1811 – 1812: (16 meses) Ocupação diversa – Exércitos patriotas |
1812 – 1814: (2 anos) Portugal |
1814 – 1816: (18 meses) Ocupação diversa – Exércitos patriotas |
1816 – 1822: (6 anos) Portugal |
1822 – 1825: (3 anos) Brasil |
1826 – 1827: (3 meses) Ocupação diversa – Exércitos patriotas |
1827 – 1828: (3 meses) Brasil |
Desde 1828: República Oriental del Uruguay |
A Fortaleza de Santa Teresa possui cinco tenalhas e é integralmente bem conservada (foto acima de Domínio Público). Está situada em um planalto, há cerca de 2,0 km da “Playa de la Moza” (praia da Menina) e à 46,0 m de altitude.
O pórtico principal da fortaleza vaza uma muralha de pedra, de espessura de 4,50 m, na sua base. Essa muralha, em tempos sem qualquer ameaça funciona como um dos passadiços superiores. O vão de entrada é composto de uma abobadilha de ceca de 3,0 m em arco rebaixado; este arco apresenta uma “saia” exterior que diminui o vão para quem o olha de fora.
Abaixo, algumas fotos mostram o paiol de pólvora e armamentos, sem dúvida uma obra prima da poliorcética. Este ambiente deve medir aproximadamente 10,0 m X 4,5 m sendo semi-enterrado no solo, aprofundado cerca de 1,0 m. Internamente a cobertura é uma abóbada de berço parabólica lajeada de pedras. A forma parabólica decorre das propriedades refletoras das parábolas e assim foi construída para garantir que em caso de detonação, não ocorreria uma explosão que externasse os danos e que estes fossem então minimizados. O fato do paiol estar semi-enterrado, também visava a reter qualquer efeito de dilatação. A abóbada é muito bem executada e tanto o traçado quanto a curvatura são primorosos. Essa abóbada de berço tem acabamento exterior coberto por um telheiro tendo o propósito de evitar que qualquer possibilidade de umidade migre para o interior do paiol, comprometendo a integridade da munição depositada. As paredes externas têm espessura de 1,20 m, executadas em gigantescos blocos de pedra (são visíveis e perceptíveis nas fotos de exteriores, bem como na foto da porta de acesso), semelhantes a aqueles que podem ser encontrados nas cortinas da fortaleza. Este paiol é uma construção absolutamente genial!
As pedras externas têm pelo menos uma face plana para assentar-se de maneira regular. Se o muro for de assentamento regular (Teoria 1), esta face deverá ser retangular. Para que o interessado possa compreender o interior de uma parede de pedra de dois metros de espessura, seguem as fotos.
À sombra da meia água, o sistema de içamento de um pesado canhão de ferro fundido.
Após a foto seguinte, na qual se observa o cuidado do palenque à sombra (varão de amarrar montaria), as três fotos seguintes poderão dar conta da capacidade de decupagem e de talho da pedra aplicado na Fortaleza de Santa Teresa. O arredondamento perfeito, os degraus alinhados milimetricamente, tudo encaixando de maneira a compor um todo naquele local: uma escada de três espelhos. Uma obra impar de mestre em cantaria.
Estrategicamente, não era razoável que uma imensa Fortaleza, a de Santa Teresa, não pudesse ter uma área para busca de socorro, de escape ou mesmo para uma circulação qualquer, quando o acesso principal estivesse por algum motivo impedido. Uma abobadilha rebaixada de berço se ocupa de vazar a espessa muralha. Ali, pensou-se em tudo e se arrumou solução para cada um dos problemas encontrados, como exemplo o escoamento da água represada, fosse pela utilização de valas (foto) ou de alcatruzes.
O inteligente aproveitamento da movimentação de terra, para o aproveitamento das posições estratégicas, dentro das muralhas é perfeito. O acesso às tenalhas e guaritas foi muito bem planejado.
Além do paiol, sobre o qual já se falou acima, é mister que se aponte a Igreja de Santa Teresa, quartéis, a “comandância“, as cozinhas de oficiais e o hospital, nas fotos que se seguem. Todos os interiores tem piso de pedra apicoada para maior segurança.
O impactante e plano cenário do pampa é um elemento muito significativo, que contribui demais, para a construção da harmonia na fortaleza. O silêncio e o canto dos pássaros nativos fazem parte dessa paisagem, tanto quanto o calor do sol ou a leve brisa marítima. No inverno, nas chuvas ou ainda quando sopra forte o vento sudoeste, denominado cortante ou minuano (em homenagem à tribo indígena), pode haver alguma transformação nessa linda paisagem.
Também é importante darmos notícia de um ambiente muitas vezes ignorado, mas de extrema importância: a comua. A ilustração abaixo, baseada no desenho de David Mc Caulay em seu livro sobre castelos, para fazer uma descrição gráfica, uma vez que as fotos falam por si. Em geral as comuas comunicam-se com o exterior de maneira direta, como no desenho. No caso da Fortaleza de Santa Teresa, há um prisma que se comunica direto com uma fossa.
A tradição é antiga: um exemplo de comua em Éfeso (século X a.C.).
Aproveitar Estereotomia em pedra da Fortaleza de Santa Teresa para ver algum dos conteúdos expostos nas Teorias 1, 2, 3 e 4, é fundamental, e será demonstrado a seguir:
a) Alcatruz interno canaliza a rede águas pluviais para local de deságue.
b) A pequena cimalha real recebe a carga do telhado de maneira estável e compõe um beiral.
c) As pequenas seteiras de talho perfeito da comua possibilitam, em segurança, aeração e iluminação ao local.
d) Amenizando os cinco ângulos agudos (um em cada tenalha), tão suscetíveis à fragilidades na pedra, ao invés de aplicar em cada um o “chanfro” (descrito na Teoria), em Santa Teresa aplicou-se o dificílimo arredondamento perfeito. Repare que o raio da curvatura vai diminuindo gradativamente, para ainda na gola, suportar a decupada bacia (parte inferior) da guarita. Nesta foto, provavelmente em função do tempo, também aflora um pedaço das fundações em pedra, para alguns denominado de baldrame para outros embasamento.
e) Sob a cimalha real, para contrapor à fragilidade que a janela impõe, pesados blocos-matacões compõem o vão, o que pode ser visto em detalhe na foto seguinte.
f) O vão de acesso da “sala Horacio Arredondo”, porta de um interessante museu local, é um arco de dintel fracionado em sistema monta-cavalo com capialçado interior, como pode se constatar na foto seguinte.
g) Capialçado interno no vão da porta de outra sala do quartel da soldadesca.
h) Foto do projeto do modelo que foi executado em impressora 3D, feito pelo grupo de estudos em Estereotomia e o modelo, propriamente dito, devidamente estabilizado e em composição perfeita. O Grupo de Estudos em Eestereotomia também produziu as perspectivas de cada um dos elementos, para avaliar as possibilidades volumétricas e de estabilidade de cada peça.
i) Na aba da Teoria 1, item 2, define-se quebramento ou distância segura como uma das mais geniais soluções, das muitas comuns na Estereotomia: é a distância que se respeita, tornando possível o desvio da junta de forma a que ela seja perpendicular à uma segunda direção, eliminando o ângulo agudo (o que causa fragilidade da pedra). Sendo este um dos princípios básicos da Estereotomia, reza então que se deva evitar o surgimento de ângulos agudos nos blocos e nas junções; é preciso estar atento, mesmo que ainda em fase projetual da decupagem, para evitar tais ângulos.
A situação se resolve, desviando-se o plano de junta que é perpendicular a um dos parâmetros, para que, ao chegar ao outro paramento, passe a formar com este uma superfície plana-perpendicular. Segundo a tradição apontada por por Amedée Frezier, este desvio deve ocorrer de cinco a oito centímetros do paramento em questão e se denomina “distância segura”.
Na foto abaixo, deve-se reparar que as juntas antes horizontais, aproximadamente 8,0 cm antes de chegarem ao corrimão em ângulo agudo, desviam e passam a ser perpendiculares ao boleado cilíndrico superior dos corrimãos. Esse desvio é feito a mais ou menos 5,0 cm desta superfície.
Como ilustração geral, com a finalidade de aumentar a ideia que se pode fazer da Fortaleza de Santa Teresa, acrescenta-se algumas imagens, abaixo: